Grupo de pesquisa ligado à linha de Comunicação e Política do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Paraná.

Jornalista ou ativista: é importante traçar a linha em tempos de crise e na era digital?

O acirramento do clima político e os frequentes questionamentos à imprensa movimentam as redes sociais e inflamam os ânimos. Comunicar sobre política na internet se tornou um desafio em temos de vazamentos seletivos, Wikileaks internacional e a disputa de interesses.

ativista

A transição para a mídia online e móvel diminuiu sem dúvida a distinção entre jornalismo e a postura ativista e talvez isso não seja uma coisa tão ruim, segundo um painel de discussão sobre o assunto no Simpósio Internacional de Jornalismo Online (ISOJ). Joel Simon, diretor-executivo do Comitê para a Proteção dos Jornalistas, citou o caso do cabeça do Wikileaks, Julian Assange. Há um debate intenso sobre se ele deve ser considerado um jornalista ou não.

“Esse debate é interessante, mas não é realmente o aspecto mais importante. Se Assange fosse julgado pela publicação dos documentos vazados, todos os jornalistas estariam em risco”, disse ele. “Os jornalistas são mais livres, mais seguros e protegidos quando a linha que separa jornalistas e ativistas é um pouquinho borrada.” Simon foi palestrante durante a sessão no simpósio, organizado pelo Centro Knight para o Jornalismo nas Américas da Universidade do Texas em Austin.

Jake Horowitz, fundador do site Mic.com, disse que repórteres na era da mídia social são mais propensos a diminuir o muro entre sua vida pessoal e profissional do que os jornalistas do passado, quando (pelo menos nos Estados Unidos) era tabu expressar publicamente qualquer tipo de opinião sobre qualquer coisa. Um foco no jornalismo agora, disse ele, é “sharability” (a qualidade de compartilhar) e as pessoas estão mais propensas a compartilhar coisas sobre as quais sentem uma forte ligação emocional, seja exuberância ou indignação. Ainda assim, ele disse, é um mito que os jovens consumidores de informação não se importam se suas fontes são tendenciosas ou não.

“Leitores mais jovens dizem que estão muito cansados da mídia partidária; eles não querem que falem para eles o que acreditar”, disse ele.

Ser ou não ser imparcial?

Horowitz disse que os jornalistas em sua redação falam regularmente sobre questões como a mudança climática e o movimento negro “Black lives matter”. Pode ser difícil fingirem ser imparciais sobre questões que acreditam apaixonadamente. Pam Fine, presidente da ASNE e catedrática Knight para Jornalismo, Liderança e Comunidade da Universidade de Kansas, contou um exemplo de um jovem editor digital após a decisão do Supremo Tribunal dos EUA derrubando a proibição sobre o casamento homossexual. O jornalista tinha publicado uma matéria e visto a reação extremamente positiva na mídia social da organização. Um editor-chefe disse ao jornalista para não esquecer de incluir o “outro lado”, disse Fine.

“Quando o editor-chefe foi embora, o editor disse em voz alta: “Chegou uma hora em que todos jornalistas acreditavam que a escravidão era ruim. Quando vamos concordar que o casamento gay é certo?'”

Daniela Gerson, editora de engajamento de comunidade no Los Angeles Times, mostrou vários exemplos de matérias online feitas pelo Times que alguns podem considerar como bordando ao ativismo.

“Nós ouvimos como as crianças imigrantes sentiam sobre como seus pais estavam sendo retratados, então fizemos um vídeo entrevistando crianças chamado ‘Dear Mr. Trump’ (Caro Sr. Trump)”.

Nele, filhos de imigrantes refutam pontos feitos por Trump sobre seus pais — sem nenhuma tentativa de representar os pontos de vista daqueles que apoiam a visão de Trump sobre imigração.

Emma Daly, diretora de comunicações do Human Rights Watch, disse que investigadores da sua organização em campo provavelmente não parecem muito diferentes de jornalistas. Eles entrevistam todos os lados – até mesmo os autores de violações dos direitos humanos, se possível. Eles seguem um código de conduta, especialmente em entrevistas sobre questões sensíveis. Eles produzem relatórios detalhados que devem ser baseados em fatos, não opinião. Mas, “nós não paramos na história; nós oferecemos recomendações para resolver o problema.”

Mesmo o jornalismo está se movendo nessa direção, disse ela, com o movimento em direção ao “jornalismo de soluções” – não apenas explicando o problema, mas propondo maneiras de melhorar a situação. Simon apontou que em países onde o CPJ trabalha, é muitas vezes considerado bastante apropriado para os jornalistas serem ativistas, especialmente por sua própria liberdade de informar, sem interferência do governo. Daly concordou. Quando você está trabalhando para poder contar histórias que o governo não quer ouvir, ela disse, “você é, de certo modo, um defensor dos direitos humanos.”

Fonte: ijnet.

Texto e imagem  sob licença CC. Flickr via Luca Sartoni