Grupo de pesquisa ligado à linha de Comunicação e Política do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Paraná.

Como o atentado que matou 50 pessoas em Orlando retrata o debate político americano

O ataque_orlando_casa_brancaatentado na boate Pulse, ocorrido no domingo (12), em Orlando, no Estado da Flórida, é o maior ataque a tiros da história dos Estados Unidos. Usando um fuzil e uma pistola, Omar Mateen, cidadão americano de 29 anos, assassinou 50 pessoas e deixou 53 feridas antes de ser morto pela polícia no local.

Atentados como esse são um problema grave cuja frequência subiu drasticamente nos últimos 5 anos no país. Os EUA são a nação desenvolvida com o maior número de homicídios por arma de fogo.

Em 2015, foram 4 ataques, deixando um total de 41 mortos. Em 2012, o atentado em uma escola em  Sandy Hook, provocou 27 mortes. Antes, em 2007, um estudante da universidade de Virginia Tech matou 32 pessoas no campus, antes de tirar a própria vida.

O atentado acontece num momento crucial das eleições presidenciais marcadas para novembro. A disputa se dá entre candidatos que têm posições opostas sobre vários temas que tocam o episódio. Veja quais são eles:

Regulação do mercado de armas

O controle e a regulamentação do mercado de armas nos EUA ocupam lugar central na agenda política do presidente Barack Obama, mas talvez estejam entre suas principais derrotas depois de dois mandados na Casa Branca. A combinação de traços culturais, elementos históricos, um lobby eficiente por parte da indústria e um bloqueio republicano no Congresso fizeram com que a discussão sobre uma legislação mais restritiva não avançasse, a despeito da recorrência dos ataques e do apoio da população.

Em seu discurso na tarde de domingo após o atentado, Obama disse que o massacre era “mais uma advertência de como é fácil para alguém colocar as mãos em uma arma que lhes permite atirar em pessoas em uma escola, ou em um lugar de culto, ou uma sala de cinema, ou em uma boate”.

Apoiada por Obama, a candidata Hillary Clinton reiterou a agenda democrata para o tema e, na sua mensagem divulgada após o atentado, afirmou que “é preciso manter as armas como as usadas na noite passada fora das mãos de terroristas ou outros criminosos violentos”. “Este é o mais mortal tiroteio em massa na história dos Estados Unidos e nos lembra mais uma vez que as armas de guerra não têm lugar nas nossas ruas”, disse ela.

O candidato do partido Republicano, Donald Trump, não citou diretamente o tema das armas de fogo e atacou os posicionamentos de Clinton e Obama: “Se não formos mais duros e espertos rapidamente, não teremos mais um país. Porque nossos líderes são fracos. Eu disse que isso ia acontecer e só  vai piorar. Estou tentando salvar vidas e prevenir o próximo ataque terrorista. Não podemos mais bancar sermos politicamente corretos.”

Terrorismo doméstico

O massacre de San Bernardino, que matou 14 pessoas na Califórnia em dezembro de 2015, foi tratado pelas autoridades como um episódio de terrorismo doméstico. As investigações descobriram que o casal responsável pelo atentado havia feito contato com grupos extremistas e viajado recentemente para o Oriente Médio.

No caso do atentado de Orlando, ainda na tarde de domingo, o Estado Islâmico assumiu a autoria do ataque. As investigações até agora, no entanto, não são conclusivas. Mas nas palavras do presidente americano, com o que se sabe até o momento, é possível dizer que “esse foi um ato de terror e um ato de ódio”.

Até agora Omar Mateen vem sendo classificado como um “lone wolf” (lobo solitário), alguém inspirado pelo Estado Islâmico, mas sem vínculos formais com a organização terrorista. Essa tem sido uma estratégia propagada pelo EI, incentivar indivíduos a cometerem atos terroristas em nome da organização.

Os dois principais pré-candidatos mencionaram a segurança nacional nas suas mensagens pós atentados. Mas enquanto Clinton escolheu palavras menos conclusivas, Trump não se absteve de chamar Mateen de terrorista.

Podemos dizer com certeza que temos de redobrar os nossos esforços para defender nosso país de ameaças em casa e no exterior. Isso significa derrotar grupos terroristas internacionais, trabalhando com aliados e parceiros para ir atrás deles onde quer que estejam, contrariando as suas tentativas para recrutar as pessoas aqui e em toda parte, e endurecendo as nossas defesas em casa. Isso também significa recusar-se a ser intimidado e permanecendo fiel aos nossos valores.” (Hillary Clinton – Pré-candidata democrata à Casa Branca)

O terrorista Omar Mir Saddique Mateen é o filho de um imigrante do Afeganistão que apoiou  abertamente o Taleban… Nós admitimos mais de 100.000 migrantes do Oriente Médio a cada ano. Desde o 11 de setembro, centenas de imigrantes e seus filhos têm sido implicados com o terrorismo nos Estados Unidos.” (Donald Trump – Pré-candidato republicano à Casa Branca)

Homofobia

A Pulse é uma boate voltada ao público LGBT. Segundo o pai do atirador, em uma viagem recente, seu filho ficou incomodado ao ver dois homens se beijando. Para ele, essa pode ser a motivação do ataque.

Em seu discurso em cadeia nacional, Obama reconheceu o caráter homofóbico do atentado e fez referência à mobilização da comunidade LGBT desde os anos 60, dizendo que “o lugar onde eles foram atacados é mais do que uma casa noturna – é um lugar de solidariedade e de empoderamento, onde as pessoas se reúnem para promover conscientização, dizer o que pensam e defender seus direitos civis”.

Clinton, que vem sendo constantemente questionada durante sua campanha por ter passado a apoiar a união entre pessoas do mesmo sexo apenas em 2014, acenou diretamente para a comunidade LGBT: “Este foi também um ato de ódio. O atirador atacou uma boate LGBT durante o mês do orgulho gay. Para a comunidade LGBT: por favor, sei que vocês têm milhões de aliados em todo o nosso país. Eu sou um deles. Continuaremos lutando pelo seu direito de viver livremente, abertamente e sem medo. O ódio não tem absolutamente lugar nenhum na América.”

Diferentemente de outros republicanos e da posição oficial do partido, Donald Trump não é um opositor dos direitos dos homossexuais. Ainda que ele já tenha se manifestado contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Na sua mensagem pós-atentado, ele não se reporta diretamente à comunidade LGBT, mas diz que  “o islamismo radical defende o ódio contra mulheres, gays, judeus, cristãos e todos os americanos”. “Eu serei um presidente para todos os americanos, e eu vou proteger e defender todos os americanos”, disse ele.

Corrida presidencial

O impacto que o atentado terá na corrida presidencial já ficou evidente. Em razão de sua gravidade e da comoção nacional que causou, o episódio deve permanecer no centro do debate, ainda mais num cenário em que as opiniões entre os candidatos são tão distintas.

O próprio Obama fez um chamado ao concluir seu discurso dizendo “nós temos que decidir se esse é o tipo de país que queremos ser”.

Aparentemente, a corrida à Casa Branca vai vocalizar valores americanos sobre esses temas, com potencial para responder à pergunta do presidente prestes a deixar o cargo.

Fonte: Nexo Jornal

Crédito da imagem: JOSHUA ROBERTS/REUTERS